A Relevância da Reforma Protestante hoje
>> segunda-feira, 12 de agosto de 2013
Para entender e reconhecer a relevância da Reforma em nossos dias, deve-se relembrar o que ela significou e porque existiu.
Vamos então considerar a história...
1. O que e porque da existência da Reforma
A Reforma Protestante do século XVI foi um fenômeno variado e complexo, que incluiu fatores políticos, sociais e intelectuais. Todavia,
o seu elemento principal foi religioso, ou seja, a busca de um novo
entendimento sobre a relação entre Deus e os seres humanos. Nesse
esforço, a Reforma apoiou-se em três fundamentos ou pressupostos
essenciais:
a) A centralidade da Escritura
Os reformadores redescobriram a Bíblia, que no final da Idade Média era um livro pouco acessível para a maioria dos cristãos. Eles estudaram, pregaram e traduziram a Palavra de Deus, tornando-a conhecida das pessoas. Eles afirmaram que a Escritura deve ser o padrão básico da fé e da vida cristã (2 Tm 3.16-17).
Todas
as convicções e práticas da Igreja deviam ser reavaliadas à luz da
revelação especial de Deus. Esse princípio ficou consagrado na expressão
latina “Sola Scriptura”, ou seja, somente a Escritura é a norma suprema
para aquilo que os fiéis e a Igreja devem crer e praticar.
Evidentemente, tal princípio teve conseqüências revolucionárias.
b) A justificação pela fé
Outro fundamento da Reforma, decorrente do anterior, foi a redescoberta do ensino bíblico de que a salvação é inteiramente uma dádiva da graça de Deus, sendo recebida por meio da fé, que também é dom do alto (Ef 2.8-9).
Tendo
em vista a obra expiatória realizada por Jesus Cristo na cruz, Deus
justifica o pecador que crê, isto é, declara-o justo e aceita-o como
justo, possuidor não de uma justiça própria, mas da justiça de Cristo.
Essa
verdade solene e fundamental foi afirmada pelos reformadores em três
expressões latinas: “Solo Christo”, “Sola gratia” e “Sola fides”.
Justificado pela graça mediante a fé, e não por obras, o pecador
redimido é chamado para uma vida de serviço a Deus e ao próximo.
c) O sacerdócio de todos os crentes
A
Igreja Medieval era dividida em duas partes: de um lado estava o clero,
os religiosos, a hierarquia, a instituição eclesiástica; do outro lado
estavam os fiéis, os leigos, os cristãos comuns.
Acreditava-se
que a salvação destes dependia da ministração daqueles. À luz das
Escrituras, os reformadores eliminaram essa distinção. Todos, ministros e
fiéis, são o povo de Deus, são sacerdotes do Altíssimo (1 Pedro
2.9-10).
Como
tais, todos têm livre acesso à presença do Pai, tendo como único
mediador o Senhor Jesus Cristo. Além disso, cada cristão tem um
ministério a realizar, como sacerdote, servo e instrumento de Deus na
Igreja e na sociedade.
Que
esses princípios basilares, repletos de implicações revolucionárias,
continuem sendo cultivados e vividos pelos herdeiros da Reforma.
2. Terá ainda razão de ser esse movimento? Justifica-se ainda o protestantismo?
A realidade nos mostra que, passados tantos anos, as verdades fundamentais e solenes redescobertas pelos reformadores continuam sendo desprezadas, tanto fora quanto dentro do movimento evangélico. Podemos exemplificar isso com um dos grandes princípios acentuados pela Reforma: “Solo Christo” ou a plena centralidade e exclusividade de Cristo como único e suficiente Salvador, o único mediador entre Deus e a humanidade.
A
Igreja contra a qual se insurgiram os reformadores continua hoje, quase
meio milênio mais tarde, a negar a Cristo um lugar exclusivo na fé, no
culto e na devoção dos seus fiéis. P
or
causa da ênfase antibíblica no culto a Maria e aos santos, Jesus Cristo
ocupa um lugar inteiramente secundário na vida e devoção de milhões de
brasileiros que se dizem cristãos e podemos ver isso claramente na
visita do papa ao Brasil, onde ele menciona muito mais Maria e os
"santos" do que propriamente a Jesus Cristo.
Mas,
lamentavelmente, devo considerar que as antigas verdades essenciais
recuperadas pelos reformadores também têm sido ignoradas dentro das
igrejas evangélicas.
Se os
reformadores voltassem à terra hoje, ficariam chocados com certas
doutrinas e práticas correntes entre os evangélicos e com a sua falta de
entusiasmo pelas importantes convicções redescobertas no século XVI.
Essas
razões já são suficientes para justificar a atual relevância e
necessidade da obra restauradora realizada pelos pioneiros da Reforma.
Um
aspecto interessante desses pioneiros é o fato de que eles, embora
compartilhassem os mesmos princípios, tiveram diferentes experiências,
que os levaram também a diferentes ênfases nos princípios que
defenderam.
Gostaria
de ilustrar três desses princípios através da experiência de três
grupos reformados, tomando como ponto de partida os capítulos iniciais
da primeira carta de Pedro.
Nessa
carta, o apóstolo lembra aos cristãos da Ásia Menor os fatos centrais da
sua fé (1.3-12) e suas implicações para a vida (1.13-17).
Em seguida, ele fala sobre as conseqüências disso para a sua identidade como grupo, como povo de Deus (1.22—2.10).
Vemos nessa passagem três grandes ênfases da Reforma.
1. Graça e Fé
O fundamento da vida cristã é o fato de que somos salvos pela graça de Deus, recebida por meio da fé. Deus nos amou, por isso nos deu seu Filho; crendo nesse amor e nesse Filho, somos salvos.
Essa é
uma das ênfases mais importantes do capítulo inicial de 1 Pedro,
especialmente nos versos 18-21, mas também em vários outros versículos.
Esse
ponto reúne três grandes princípios esposados pelos reformadores: “solo
Christo”, “sola Gratia” e “sola Fide”. Embora não encontremos aqui uma
referência explícita à justificação pela fé como nas cartas aos Romanos e
aos Gálatas, ela é pressuposta em todo o contexto.
Inicialmente,
seu pai desejou que ele seguisse a carreira jurídica. Um dia, ao
escapar por pouco da morte, fez um voto a “Santa Ana” de que entraria
para a vida religiosa. Ingressou em um mosteiro agostiniano e pôs-se a
lutar pela sua salvação, sem alcançar a paz interior que tanto almejava.
Até
que, ao estudar a Epístola aos Romanos, deparou-se como a promessa de
que “o justo viverá pela fé” (Rm 1.17). Teve uma nova visão de Deus e da
salvação. Esta já não era o alvo da vida, mas o seu fundamento. Essa
nova convicção o levou a questionar a teologia medieval e a iniciar o
movimento da Reforma.
Isso
nos mostra a importância de uma vida de fé, na plena dependência da
graça de Deus, mas também de uma vida de compromisso, que se manifesta
na forma de frutos que honram a Deus.
2. A Palavra de Deus
2. A Palavra de Deus
A seção seguinte de 1 Pedro contém outra ênfase importante dos reformadores: a centralidade da Palavra de Deus (1.23-25).
A
Palavra de Deus é a mensagem que nos fala da graça de Deus e da redenção
realizada por Cristo, e nos convida a crer nesse amor. Essencialmente, é
o “evangelho” (verso 12), também descrito como a “verdade” (verso 22).
Essa palavra ou evangelho é viva, permanente e eficaz porque é a própria “Palavra do Senhor”.
Se o item anterior nos faz pensar em Lutero, este nos lembra de modo especial João Calvino.
Sua
experiência foi profunda, mas sem grandes lutas interiores. Ele mesmo
pouco escreveu sobre o assunto, dizendo apenas que teve uma conversão
repentina (“conversio súbita”).
Mas
desde o início esse reformador foi tomado por uma forte convicção acerca
da majestade de Deus e da importância da sua palavra. Calvino foi,
dentre todos os reformadores, aquele que mais energias dedicou a estudo e
à exposição sistemática das Escrituras – nas Institutas, nos seus
comentários bíblicos, em suas preleções e em seus sermões.
Nos seus escritos, Calvino insiste na suprema autoridade das Escrituras em matéria de fé e vida cristã (“sola Scriptura”).
Essa
autoridade decorre do fato de que Deus mesmo nos fala na sua Palavra.
Ele faz uma distinção interessante entre Escritura e Palavra de Deus, ao
dizer que é somente através da atuação do Espírito Santo que a
Escritura é reconhecida pelo pecador como a Palavra de Deus viva e
eficaz.
Esse ponto nos mostra a necessidade de obediência à Palavra do Senhor para vivermos uma vida cristã genuína e frutífera.
3. Sacerdócio Real
Finalmente, Pedro fala da grande dimensão comunitária da nossa fé.
Unidos a
Cristo e alimentados por sua Palavra (2.2-4), somos chamados a viver
como edifício de Deus e como povo de Deus (2.5, 9).
Nas duas referências, os cristãos são descritos como sacerdócio: “sacerdócio santo” e “sacerdócio real”.
A conclusão é óbvia: todo cristão é um sacerdote.
Não
existe mais a distinção entre sacerdotes e “leigos” que havia no Antigo
Testamento, mas agora todos têm acesso livre e direto acesso à presença
de Deus, por meio de Cristo. Esse sacerdócio deve ser exercido
principalmente em duas áreas: no culto e na proclamação. Todos os
crentes podem e devem oferecer “sacrifícios espirituais agradáveis a
Deus por intermédio de Jesus Cristo” (v. 5); todos os cristãos devem
proclamar as virtudes daquele que o chamou das trevas para a sua
maravilhosa luz (v. 9).
Os que conhecem alguma coisa sobre a Reforma reconhecem facilmente aqui o princípio do “sacerdócio universal dos fiéis”.
Um grupo reformado que ilustra muito bem essa verdade foram os anabatistas.
Todos
os protestantes valorizaram o sacerdócio universal, mas ele foi
especialmente importante para esse grupo incompreendido e horrivelmente
perseguido que insistia que a Igreja devia ser uma associação voluntária
de crentes, inteiramente separada do Estado e caracterizada pela mais
plena igualdade e solidariedade entre todos.
Uma bela aplicação do ensino de que todo cristão é um sacerdote de Deus.
Esse aspecto nos mostra a importância da comunhão cristã no corpo de Cristo. Como dizia a placa de uma igreja nos Estados Unidos: “Pastor: reverendo tal; ministros: todos os membros”.
Conclusão
A Reforma do Século XVI foi, mais que uma simples reforma, uma obra de restauração. Restauração de antigas verdades que haviam sido esquecidas ou obscurecidas ao longo dos séculos, e agora foram recuperadas. Essa obra deve continuar em cada geração, seguindo um lema dos reformadores: “Ecclesia reformata, semper reformanda” (igreja reformada, sempre se reformando).
Louvemos a Deus e honremos a memória dos nossos predecessores na fé resgatando esses valores e vivendo de acordo com os mesmos nos dias atuais. Tornemos nossa fé relevante para os nossos contemporâneos, sem fazer concessões que comprometam a pureza do Evangelho de Cristo.
Pr. Magdiel G Anselmo.
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