Cristãos viram alvos no tiroteio do mundo árabe
>> quarta-feira, 21 de agosto de 2013
Afinal, o "tiro ao cristão" está virando uma espécie de esporte macabro no Oriente Médio? Quem está atirando, quem resiste ou foge e quem está tentando protegê-los?
Você imaginaria que "para os cristãos sírios, quem os protege são a Rússia e o Irã, além de Assad, e não os EUA e a França, a quem consideram aliados do extremismo islâmico"?
Essas são
apenas algumas das questões e das surpreendentes contradições
geopolíticas e religiosas que artigo bastante detalhado e elucidativo do
blog do Guga Chacra tenta explicar no Estadão:
Entenda a situação dos cristãos do Egito
Os
cristãos do Egito, majoritariamente coptas, desde a Revolução Arabista
de Nasser, nos anos 1950, nunca tiveram a mesma importância dos cristãos
do Líbano, do Iraque e da Síria para seus países. Diferentemente de
seus pares em Damasco, Bagdá e Beirute, onde integram ou integravam a
elite, os egípcios sempre enfrentaram dificuldades no Cairo e
Alexandria.
Durante
o regime de Hosni Mubarak, muitos deles viviam nos lixões do Cairo,
onde criavam porcos. Os cristãos também eram perseguidos e raros, como o
ex-secretário-geral da ONU Boutros Boutros Ghali, alcançavam posições
de importância.
Apenas
como comparação, no Líbano, os cristãos possuem o cargo de presidente,
chefe das Forças Armadas, metade do gabinete ministerial e metade do
Parlamento. Verdade, representam cerca de um terço da população,
enquanto no Egito são 10%. Mas, na Síria, onde a proporção é similar à
egípcia, os cristãos sempre tiveram cargos importantes, incluindo, até
recentemente o de ministro da Defesa.
Mesmo
antes da Primavera Árabe, os cristãos, ao redor do mundo árabe,
buscaram se aliar a setores mais fortes em suas sociedades para tentar
se proteger. Algo normal para minorias religiosas. Ditadores seculares
sempre foram vistos como protetores em Bagdá e Damasco, por exemplo. No
Iraque, até 2003, os cristãos eram abertamente a favor do regime de
Saddam Hussein – o número dois do regime era o cristão caldeu Tariq
Aziz. Na Síria, sempre estiveram ao lado da família Assad.
No
Líbano, até a Guerra Civil de 1975 a 90, os cristãos eram os mais
poderosos. Depois, em uma nação politicamente nos dias de hoje dividida
entre sunitas e xiitas, a maior parte dos cristãos, seguidores de Michel
Aoun, buscou em uma aliança com os xiitas do Hezbollah a sua proteção.
Outros, como os seguidores de Samir Gaegea, acharam melhor se aliar aos
sunitas de Saad Hariri.
No
Iraque, a aposta dos cristãos, em se aliar a Saddam, foi um grande
erro. A invasão americana fez centenas de milhares de cristãos
iraquianos buscar refúgio na Síria e nos braços de Assad que, como o
ditador em Bagdá, sempre protegeu os cristãos.
A
Guerra Civil da Síria fez os cristãos sírios, incluindo autoridades
religiosas, a apoiarem em massa as forças de Assad, um líder secular,
embora alauíta, uma vertente moderada do islamismo, e com o apoio da
classe média sunita não religiosa das grandes cidades. O medo dos
cristãos sírios eram acabar como os iraquianos. Neste caso, a aposta
deles tem sido positiva, por um lado, pois Assad está vencendo a guerra.
De outro, porém, são alvos dos rebeldes radicais sunitas da oposição
que, com o apoio do Golfo e de Nações ocidentais, alvejam vilas cristãs
que são alvos de massacres – para os cristãos sírios, quem os protege
são a Rússia e o Irã, além de Assad, e não os EUA e a França, a quem
consideram aliados do extremismo islâmico.
Os
cristãos egípcios, por sua vez, nunca tiveram um protetor. Para eles,
não há um Assad ou um Saddam e tampouco uma Rússia ou um Irã para
defende-los. E tampouco possuem o poder político e econômico dos
cristãos libaneses, que também são elite ao redor do mundo, incluindo em
São Paulo.
Já
tratados cidadãos de segunda classe nos anos de Mubarak, os cristãos
apostaram inicialmente na redemocratização do Egito. Mas, com o
presidente Mohammad Morsy, da Irmandade Muçulmana, fazendo propostas que
não respeitavam totalmente as demais religiões do Egito, especialmente a
cristã, eles se juntaram aos milhões de manifestantes pedindo a queda
do então líder egípcios. E decidiram apostar nos militares.
Esta
opção, porém, parece não estar sendo eficiente. Os cristãos, que não
são responsáveis diretos pelos massacres de membros da Irmandade
Muçulmana nesta semana, vem se transformando em bode expiatório por
parte da Irmandade. Dezenas de igrejas foram queimadas nos últimos dias.
O problema é que, diferentemente de Saddam e de Assad, com todos os
seus defeitos de ditadores sanguinários, o general Sisi, assim como
Mubarak anteriormente, não está preocupado com os cristãos. De uma certa
forma, até os usa como tática de PR para dizer que os membros da
Irmandade Muçulmana são radicais no Ocidente.
Uma
pena, mas o cristianismo egípcio corre enorme risco. Cada vez mais, o
único bastião seguro para os cristãos no mundo árabe é o Líbano e a
Cisjordânia, além da Síria, se Assad conseguir vencer a guerra.
0 comentários:
Postar um comentário