Francisco, o papa protestante?
>> segunda-feira, 6 de maio de 2013
O ''protestantismo'' do Papa Francisco
Quando eu
li o que Bergoglio disse sobre a questão dos ateus, eu tive um
pensamento provocativo que eu me senti tentado a pôr no início desta
coluna. Algo assim: "Ei, católicos: vocês sabem o que vocês fizeram?
Vocês escolheram um papa protestante".
A opinião
é de Bill Tammeus, elder presbiteriano e ex-colunista religioso do
jornal The Kansas City Star, pelo qual recebeu diversos prêmios. É autor
do blog Faith Matters e colunista mensal da revista The Presbyterian
Outlook. Seu livro mais recente, em coautoria com o rabino Jacques
Cukierkorn, é They Were Just People: Stories of Rescue in Poland During
the Holocaust.
O artigo foi publicado no sítio National Catholic Reporter, 01-05-2013. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Eu
costumo dizer às pessoas que, se você se perder na teologia da Tradição
Reformada (leia-se presbiteriana), você sempre pode voltar à estaca
zero, que diz, em essência, isto: Deus é soberano.
Ou
– em estilo, eu prefiro esta outra, porque a maioria de nós não tem
nenhuma experiência de vida sob um soberano – Deus é gloriosamente
livre.
Eu
pensei sobre isso outro dia, quando eu li algo que o Papa Francisco
disse em um livro do qual ele foi coautor em 2010, como cardeal Jorge
Mario Bergoglio. Falando sobre como ele conversaria com um ateu,
Bergoglio escreveu: "Eu não lhe diria que a sua vida está condenada,
porque estou convencido de que não tenho o direito de fazer um juízo
sobre a honestidade dessa pessoa".
Essa,
amigos, é a teologia da Tradição Reformada. Cabe a Deus determinar quem
terá a vida eterna. Não cabe a nós. Mesmo que você recorra aos
conceitos difíceis de seguir do fundador da Tradição Reformada, João
Calvino, sobre predestinação (sem falar da dupla predestinação), você
descobrirá que nenhum ser humano pode saber ao certo quem está salvo e
quem está condenado.
Esse
ponto, uma vez, levou minha amiga Kathleen Norris a escrever isto no
seu livro Amazing Grace: A Vocabulary of Faith: "Surpreende-me que só um
advogado francês poderia chegar a uma justificação tão complexa, senão
bizarra, para tratar todas as pessoas como se elas pudessem estar entre
os eleitos, os escolhidos de Deus".
Ela
está certa. Mesmo que você compre a ideia do esquema calvinista "alguns
se salvam, alguns são condenados e não há a nada que você possa fazer a
respeito", você não sabe quem é quem, por isso você precisa ser bom
para com todos, na teoria de que você pode passar a eternidade com essa
pessoa.
E isso é quase a mesma coisa que Bergoglio está dizendo em Sobre o Céu e a Terra, coescrito com o rabino Abraham Skorka.
Quando
eu li o que Bergoglio disse sobre esse assunto, eu tive um pensamento
provocativo que eu me senti tentado a pôr no início desta coluna. Algo
assim: "Ei, católicos: vocês sabem o que vocês fizeram? Vocês escolheram
um papa protestante".
Mas,
no dia seguinte que eu li as palavras do papa, eu descobri que alguém
tinha sido mais rápido do que eu nessa conclusão. O escritor Jonathan
Merritt fez essa pergunta sobre o Papa Francisco no seu artigo do site
Religion News Service: "A crescente popularidade (de Francisco) entre os
não católicos pode torná-lo o primeiro papa protestante?".
Merritt
acrescentou: "A combinação da preocupação do novo papa com as questões
de justiça e a sua teologia conservadora parecem ser atraentes para
muitos daqueles protestantes socialmente conscientes" (eu gosto do que
Merritt disse, embora eu não fique feliz que ele tenha posto por escrito
antes de mim a ideia de que Francisco pode ser o primeiro papa
protestante. Mas deixe estar).
Aqueles
de nós que fazem parte das principais Igrejas protestantes
(presbiterianos, metodistas, luteranos etc.) têm sido exaustivos no que
se refere às preocupações de justiça social e superficiais no que se
refere ao respeito pelas estruturas de governo hierárquicas e rituais
extravagantes.
Nós
pagamos um preço por causa dessa ênfase, mas é um preço que nós temos
estado dispostos a pagar. E agora muitos de nós acham que o novo papa
tem a intenção de aproximar a Igreja Católica um pouco mais dessa
abordagem protestante.
Talvez
pudéssemos nos encontrar no meio do caminho. Nós, protestantes,
acrescentaremos mais ritual, e vocês, católicos, podem descentralizar a
sua estrutura de governo, enquanto nós, juntos, lavamos os pés dos
pobres.
Eu
sei que soa um pouco jocoso, mas eu estou falando sério. Há muita coisa
que podemos aprender uns com os outros, e o aprendizado disso pode nos
aproximar mais de algum tipo de reunificação (ao menos de espírito),
quase 500 anos depois que Martinho Lutero pregou as suas 95 teses na
porta da catedral, dando início assim (inadvertidamente) a Reforma
Protestante.
Nós,
protestantes, não temos o nosso próprio papa para negociar um grande
acordo com Francisco, mas, se ele realmente é o primeiro papa
protestante, o problema está resolvido. Tudo o que nós, protestantes, e
vocês, católicos, precisamos fazer, para início de conversa, é prestar
atenção às vezes em que ele se posiciona no nosso campo comum e nos
unirmos a ele lá.
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