O Sofrimento do Justo
>> domingo, 24 de junho de 2012
Um idoso pastor
se encontrava gravemente enfermo na cama e sofria terríveis dores. Um
jovem obreiro que o visitava desejou consolá-lo. Cheio das melhores intenções,
falou: "Deus disciplina a quem ama!" Ao que o velho homem retrucou,
cheio de dores: "Sim, mas agora, neste instante, eu desejaria que Deus
amasse outra pessoa!"
Muitas vezes
usamos frases feitas ou procuramos explicações para o sofrimento
do próximo mas não chegamos ao fundo da questão. Sobre
o sofrimento do Filho de Deus está escrito: "Por isso foi que
também Jesus, para santificar o povo, pelo seu próprio sangue,
sofreu fora da porta" (Hb 13.12).
O
inexplicável
sofrimento dos justos
sofrimento dos justos
O sofrimento
de um justo não pode ser explicado, mas muitas e muitas vezes sua razão
de ser foi interpretada de maneira incorreta. Muitos cristãos que estão
sofrendo se preocupam demais em achar a "causa" de sua angústia
e se esgotam de tanto questionar. Minha doença é castigo pelo
meu pecado? Ou será que Deus quer me disciplinar, educar, purificar,
transformar através do sofrimento, me preparar para Seu Reino e Sua glória?
– É claro que existem castigos mandados por Deus, mas nem de longe todo
o sofrimento físico ou emocional, toda derrota, fome ou tormento podem
ser explicados dessa maneira. Quem recebeu a Jesus Cristo em sua vida por meio
da fé não sofre por causa da ira de Deus ou por castigo, mas o
sofrimento é uma provação e é igualmente um meio
pedagógico que o Senhor usa na vida dos crentes (Hb 12.1-11; Rm 8.31-39).
Mas não são raras as vezes em que o agir de Deus e a Sua direção
em nossas vidas continuará sendo um mistério para nós,
principalmente quando Ele manda sofrimento e tristeza.
Não
queremos deixar passar despercebido o fato de que nem todo o sofrimento tem
a amável correção do Senhor como alvo final. Existem sofrimentos
que nascem do ódio satânico, e se os mesmos nos alcançam
foi porque o Senhor o permitiu. Os sofrimentos de Jó, por exemplo, não
vieram de Deus. Também não havia motivo para correção
na vida desse homem, pois Jó vivia completamente dentro do que agradava
ao Senhor e era irrepreensível, o que foi confirmado pelo próprio
Senhor. Seus sofrimentos eram provocados pelo maligno (comp. Jó 1.1,6-19).
Os Salmos e
Provérbios também falam do sofrimento do justo: "Muitas
são as aflições do justo!" (Sl 34.19a; comp. também
Pv 11.31). A Bíblia nos exorta a não considerarmos todo e
qualquer sofrimento dos justos como conseqüência automática
de culpa e pecado em suas vidas, pois com isso estaríamos condenando
a maneira justa de viver dos retos de coração. Asafe orou: "Com
efeito, inutilmente conservei puro o coração e lavei as mãos
na inocência. Pois de contínuo sou afligido, e cada manhã
castigado. Se eu pensara em falar tais palavras, já aí teria traído
a geração de teus filhos" (Sl 73.13-15). Também
no Salmo 44 encontramos uma das muitas indicações da Palavra de
Deus de que sofrimento nem sempre tem sua origem em pecado ou culpa diante de
Deus e nem sempre é castigo por erros cometidos: "Tudo isso nos
sobreveio, entretanto não nos esquecemos de ti, nem fomos infiéis
à tua aliança. Não tornou atrás o nosso coração,
nem se desviaram os nossos passos dos teus caminhos... Se tivéssemos
esquecido o nome do nosso Deus ou tivéssemos estendido as mãos
a deus estranho, porventura não o teria atinado Deus, ele que conhece
os segredos dos corações? Mas, por amor a ti, somos entregues
à morte continuamente, somos considerados como ovelhas para o matadouro"
(vv. 17-18, 20-22). Mas todo esse sofrimento estava sob a permissão
de Deus: "...para nos esmagares onde vivem os chacais, e nos envolveres
com as sombras da morte... Pois a nossa alma está abatida até
ao pó, e o nosso corpo como que pegado no chão. Levanta-te para
socorrer-nos, e resgata-nos por amor da tua benignidade (vv. 19,25-26)."
Antes que eu
mencione o testemunho do irmão Lee, da Coréia do Sul, perguntemo-nos:
todos esses sofrimentos foram resultado de pecado na vida desse irmão?
Ele conta:
Eu
tinha 18 anos de idade quando os norte-coreanos invadiram a Coréia do
Sul. Presenciei quando 7.000 cristãos foram mortos, inclusive meu pai
e minha irmã. Durante três dias minha irmã ficou pendurada
de cabeça para baixo em uma corda. No terceiro dia, ela estava quase
desacordada. Todos os dias os comunistas nos levavam para fora para que pudéssemos
ver como eram tratados os cristãos presos. Todos tínhamos sido
presos e interrogados: "Você é cristão?" Naquela
época minha irmã tinha 22 anos de idade. E naquele dia em que
fui obrigado a ficar na sua frente, ela me reconheceu. Sangue já escorria
de sua cabeça. Me senti impotente diante dela, pois estava amarrado.
Mas ela cantava num sussuro: "Em Jesus amigo temos..." e "Mais
perto quero estar, meu Deus de Ti..." E foi dessa maneira que ela morreu,
mas sua morte vitoriosa deixou uma profunda impressão em minha vida.
– Uma semana depois meu velho pai de 72 anos foi executado. Ele foi queimado
vivo, depois de ter passado fome por um mês. Jogaram-no em uma cova, cobriram-no
com querosene e tocaram fogo. Antes de perder os sentidos, gritou com suas últimas
forças: "Você tem de acabar o que eu não consegui levar
até o fim!" Então levantou suas mãos e orou: "Pai,
perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem!"
Esses
dois acontecimentos deixaram marcas em toda a minha vida futura, marcas que
nunca mais puderam ser apagadas. Não posso descrever os sofrimentos que
tive que passar. Durante um mês inteiro meus carrascos me espancaram,
queimaram e quebraram meus ossos. Quando eles finalmente acharam que eu estava
morto, jogaram-me em um pântano. Fiquei oito dias inconsciente no meio
de cadáveres. Os ratos passavam por cima de nós e o sofrimento
era infernal. Mas nessa hora eu entreguei minha vida ao Senhor Jesus. Reconheci
o que significa na vida de uma pessoa um relacionamento pessoal com Jesus: no
mais profundo sofrimento pode nascer a alegria da fé!
Os terríveis
sofrimentos e a angústia de sua irmã e de seu pai e seus próprios
sofrimentos contribuíram para que o Dr. Lee chegasse a crer no Senhor
Jesus Cristo – que maravilhoso fruto de sofrimento por amor ao Senhor!
Será
que você anda encurvado sob o fardo de sofrimentos e pressões do
dia-a-dia que pesa sobre os seus ombros? Você se angustia com problemas
e infortúnio? Você sofre por fracassos, decepções,
esperanças frustradas? Ou você sofre por amor a Cristo? Existe
uma cruz pesada sobre sua vida, cruz que você tem de carregar?
Qual
é a causa do sofrimento, se não é o pecado?
Sofrimento
por amor a Jesus. Foi dito ao apóstolo Paulo que ele iria sofrer
muito por amor a Jesus (At 9.16). O Senhor o usou de modo extraordinário
como instrumento muito útil, mas os sofrimentos de Paulo foram igualmente
extraordinários. Os profundos sofrimentos por amor a Jesus faziam parte
de sua elevada vocação.
Sofrimentos
por amor a Jesus não são motivo de tristeza, mas de alegria: "...
alegrai-vos na medida em que sois co-participantes dos sofrimentos de Cristo,
para que também na revelação de sua glória vos alegreis
exultando" (1 Pe 4.13). E sofrer pelo Evangelho é um tipo de
sofrimento por amor a Jesus (2 Tm 1.8), assim como sofrimentos por praticar
o bem (1 Pe 2.20), sofrimentos por causa da justiça (Mt 5.10) e os sofrimentos
como servos de Deus (2 Co 6.4 ss.).
Sofrimentos
por amor aos outros (à Igreja). É isso o que nos relata Colossenses
1.24: "Agora me regozijo nos meus sofrimentos por vós; e preencho
o que resta das aflições de Cristo, na minha carne, a favor do
seu corpo, que é a igreja." Sofrimentos suportados com paciência
por um cristão servem de exemplo e testemunho para toda a Igreja, pois
é nisso que o caráter de Jesus mais se reflete. E é por
isso que as pessoas mais santificadas têm de sofrer mais, por estarem
muito próximas do Senhor e por terem condições de suportar
o sofrimento. Epafrodito, cooperador de Paulo, ficou gravemente enfermo por
causa da obra do Senhor e por servir ao apóstolo por parte dos filipenses
(comp. Fl 2.25-30).
Sofrimentos
por testemunhar da fé para a glória do Senhor. Para provar
isso quero citar novamente 1 Pedro 4.13: "...alegrai-vos na medida em
que sois co-participantes dos sofrimentos de Cristo, para que também
na revelação de sua glória vos alegreis exultando."
O salmista Asafe testemunha em meio ao seu sofrimento: "Todavia, estou
sempre contigo, tu me seguras pela minha mão direita. Tu me guias com
o teu conselho, e depois me recebes na glória. Quem mais tenho eu no
céu? Não há outro em quem eu me compraza na terra. Ainda
que a minha carne e o meu coração desfalecem, Deus é a
fortaleza do meu coração e a minha herança para sempre...
Quanto a mim, bom é estar junto a Deus; no Senhor Deus ponho o meu refúgio,
para proclamar todos os seus feitos"(Sl 73.23-26, 28).
Será
que conseguimos imaginar o testemunho glorioso e elogiado que um servo de Deus
que sofre por amor ao Senhor tem diante do mundo invisível dos anjos,
quando se firma no Senhor e espera nEele em meio aos sofrimentos, e quando consegue
dizer "Senhor, apesar de tudo eu quero ficar perto de Ti"? Como é
grandioso e maravilhoso o reflexo desses sofrimentos na eternidade! Isso é
mostrado em Romanos 8.18: "Porque para mim tenho por certo que os sofrimentos
do tempo presente não são para comparar com a glória por
vir a ser revelada em nós."
O
que devemos fazer no sofrimento?
Como é
que a nossa alma consegue ficar consolada e quieta em tempos de angústia?
Em tempos de sofrimento ninguém mais consegue ajudar aquele que sofre
a não ser o Senhor. Isso o salmista também sabia, pois orava:
"Faze-me justiça, ó Deus, e pleiteia a minha causa...
Pois tu és o Deus da minha fortaleza" (Sl 43.1a,2a). Jesus Cristo
sofreu fora da porta – e, nesse sentido, cada um que sofre está sozinho
com seus sofrimentos, sofre "fora da porta" como Jesus. O salmista
também tinha reconhecido isso, e encomendou sua alma juntamente com toda
a sua angústia ao fiel cuidado de Deus. Ele sabia que a ajuda real, a
ajuda que traz resultados não pode vir de pessoas, mas única e
exclusivamente do Deus vivo. E era a Deus que ele queria entregar seu sofrimento.
Ele não foi obrigado a se deixar enlouquecer e inquietar pelos outros
e por seus bons conselhos, mas foi capaz de se entregar plenamente à
vontade divina, e de se sentir abrigado e seguro no Senhor.
Ficamos consolados
e tranqüilos quando entregamos nossa angústia ao Senhor, quando
nos aquietamos e esperamos nEele.
Dificilmente
o sofrimento pode ser explicado humanamente, ele só pode ser compreendido
de dentro do santuário. Por isso o salmista orou: "Por que me
rejeitas? Por que hei de andar eu lamentando sob a opressão dos meus
inimigos? Envia a tua luz e a tua verdade, para que me guiem e me levem ao teu
santo monte, e aos teus tabernáculos. Então irei ao altar de Deus,
de Deus que é a minha grande alegria; ao som da harpa eu te louvarei,
ó Deus, Deus meu. Por que estás abatida, ó minha alma?
por que te perturbas dentro em mim? Espera em Deus, pois ainda o louvarei, a
ele, meu auxílio e Deus meu" (Sl 43.2b-5). O coração
do salmista estava repleto de porquês. Ele não conseguia entender
o porquê de seus sofrimentos; mas parece que, de repente, ele passou a
entender, passou a não mais precisar de uma resposta para suas muitas
perguntas – mas precisava somente de uma profunda comunhão com seu Deus
no santuário (vv. 3b-4a). Essa foi a solução. Foi dessa
maneira que sua alma conseguiu ficar quieta e consolada e cheia de gratidão
para com o Senhor apesar do sofrimento pelo qual estava passando (vv. 4b-5).
Nem sempre existe uma resposta, mas sempre existe consolo e luz na escuridão
de nossa alma quando nos achegamos ao Senhor, quando entramos no santuário.
E é por isso que filhos de Deus santificados conseguem dizer: "O
Senhor está tão perto de mim!" Para o salmista passou a ser
secundário conhecer ou não a causa de seus sofrimentos. Para ele
passou a ser prioridade saber que era Deus que conduzia sua vida, passou a ser
prioridade andar na luz do Senhor, andar na verdade do Senhor e ser dirigido
pelo Senhor para alcançar seu alvo de vida.
Asafe estava
cheio de dúvidas e questionamentos. Parecia-lhe que o sofrimento ela
algo sem lógica, algo incompreensível e absurdo. Ele não
era capaz de entendê-lo nem explicá-lo: "Em só refletir
para compreender isso, achei mui pesada tarefa para mim; até que entrei
no santuário de Deus..." (Sl 73.16-17). No santuário
nem sempre recebemos a explicação para o porquê de nossos
sofrimentos, mas em compensação recebemos consolo, recebemos fortalecimento
e uma profunda paz. Até um homem como Elias chegou ao ponto de se sentir
desesperado e questionava o motivo de tanto sofrimento. Ele não recebeu
uma resposta para suas perguntas, mas recebeu comida e bebida para sua longa
jornada em busca de um novo encontro com o Senhor. João Batista foi tomado
de dúvidas quando estava no cárcere. E ele também não
recebeu resposta ao porquê de seus sofrimentos, dúvida que certamente
ocupava sua mente. Mas ele recebeu a palavra do Senhor: "...bem-aventurado
é aquele que não achar em mim motivo de tropeço" (Mt
11.6).
Agora me dirijo
a você, especialmente a você que tem sofrimento e dor em sua vida,
que passa por angústias e enfermidades – você não quer simplesmente
entrar no santuário para receber ali o consolo que vem de Deus? Em pouco
tempo se cumprirá em sua vida o que o Senhor glorificado diz no último
livro da Bíblia: "E lhes enxugará dos olhos toda lágrima,
e a morte já não existirá, já não haverá
luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras cousas passaram. E aquele que
está assentado no trono disse: Eis que faço novas todas as cousas.
E acrescentou: Escreve, porque estas palavras são fiéis e verdadeiras...
O vencedor herdará estas cousas, e eu lhe serei Deus e ele me será
filho" (Ap 21.4-5,7). (Norbert Lieth)
Norbert
Lieth É Diretor da Chamada da Meia-Noite Internacional. Suas mensagens
têm como tema central a Palavra Profética. Logo após sua conversão, estudou
em nossa Escola Bíblica e ficou no Uruguai até concluí-la. Por alguns anos
trabalhou como missionário em nossa Obra na Bolívia e depois iniciou a divulgação
da nossa literatura na Venezuela, onde permaneceu até 1985. Nesse ano, voltou
à Suíça e é o principal preletor em nossas conferências na Europa. É autor
de vários livros publicados em alemão, português e espanhol.
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