Sal do mundo e luz da terra
>> sábado, 9 de março de 2013
Por Maurício Zágari
Sábado
passado fui palestrar em um retiro de líderes de cerca de 40 igrejas
batistas em São João de Meriti (RJ). Era ainda cedo e um irmão
heroicamente se despencou de longe para me pegar em casa e me levar ao
sítio onde aconteceria o evento. Estávamos no carro, a caminho do
encontro, quando tivemos o susto: bem ao nosso lado ocorreu uma batida
entre dois automóveis. Confesso que não entendo nada de marcas de carro,
só sei que um era vermelho e o outro, verde. O verde dobrou mal uma
esquina e acertou o vermelho na parte de trás. Com o susto do estrondo,
olhei para o lado e vi que o carro atingido tinha diversos produtos
cristãos colados na traseira: adesivos com versículos bíblicos e, bem no
lugar da batida, um daqueles peixes de plástico prateado que reproduzem
o símbolo primitivo de Jesus (o Ichtus). Paramos para ver se alguém
tinha se machucado e vimos que os dois motoristas saíram ilesos da
colisão. Foi quando o pior aconteceu.
O que ocorre quando alguém bate no carro de um cristão? Que reação
você espera do dono do automóvel? Confesso que, na minha ingenuidade,
suponho que um servo de Cristo vai manter o domínio próprio (que é
virtude do fruto do Espírito), vai pacificar (o que fará dele um
bem-aventurado), conversará com o proprietário do outro veículo de forma
mansa (mansidão também faz parte do furto do Espírito), será cuidadoso
na escolha das palavras (Mateus 12.36 – “Digo-vos que de toda palavra frívola que proferirem os homens, dela darão conta no Dia do Juízo”), tudo o que falar será no sentido de resolver de forma civilizada o incidente (Provérbios 15.1 – “A resposta branda desvia o furor, mas a palavra dura suscita a ira”) e resolverá tudo com amabilidade (Tiago 1.19 – “Sabeis estas coisas, meus amados irmãos. Todo homem, pois, seja pronto para ouvir, tardio para falar, tardio para se irar”).
Bem,
isso era o que eu imaginava. Mas o que vi foi algo completamente
diferente. O dono do carro cheio de adesivos cristãos já saltou falando
os palavrões mais interessantes que ouvi em toda minha vida. Pense nos
piores que você conhece. Pois foram exatamente esses que o irmão falou. E
mais: enquanto o motorista aparentemente não cristão que bateu em seu
carro veio com tranquilidade conversar, o servo de Jesus saltou de seu
banco com uma atitude que me fez pensar que daria um tiro no outro – ou
pelo menos sairia no braço. Ou seja: o mano chegou pronto para a briga.
Não ficamos no local por muito
mais. Mas ainda tive tempo suficiente de ver o amado irmão dizer montes
de impropérios contra o pobre cidadão que teve o azar de bater nele, o
que me fez lembrar um lutador de UFC “cristão”. Ou seja: mais
agressividade impossível. Fui embora conversando com Wagner, meu
anfitrião, sobre o testemunho público que nós, crentes em Jesus, temos
dado para o mundo.
A
colisão foi bem em cima do Ichtus de plástico, ou seja, não tinha como
qualquer pessoa que estivesse por ali não ver que aquele homem
transtornado era frequentador de uma igreja evangélica, os adesivos
denunciavam. E todos viram a reação agressiva do mano. O não cristão até
tentou apaziguar a fúria desbocada do irmão em Cristo, mas só recebeu
de volta pedradas, acusações, ofensas e ameaças.
Belo testemunho. Se eu fosse
aquele rapaz, pensaria que todos os evangélicos são desbocados,
agressivos, descontrolados, belicosos. Em outras palavras: o que há de
pior entre os homens. Isso me conduziu a uma profunda reflexão sobre
como tem sido nosso exemplo ante a sociedade. Temos sido sal da terra e
luz do mundo? Ou temos vivido um evangelho todo trocado, como sal do
mundo e luz da terra – do tipo “parece mas não é”? Pois, se for o caso,
se todos agirmos como aquele homem, para nada mais prestamos senão para
ser lançados fora e pisados pelos homens. (Mt 5.13).
Comportamento é uma coisa
interessante, pois ele revela muito sobre a pessoa que se esconde por
trás da máscara de crente. Nunca me esqueço de uma vez em que estava
andando quando vi uma irmã em um ponto de ônibus. Caminhei contente em
direção a ela para saudá-la, quando vi que fez sinal para um ônibus –
que a ignorou e passou direto. A irmã, que não tinha me visto, gritou um
palavrão para o motorista, questionando a moralidade da pobre mãe
daquele indivíduo. Constrangido, me desviei e segui meu caminho sem que
ela percebesse que eu tinha testemunhado aquela cena, para não
envergonhá-la.
Nossa
pregação é inútil se nosso exemplo pessoal contraria o evangelho.
Quando cometi meus piores pecados ocultos dei graças a Deus por ninguém
ter visto, pois senão o Senhor teria sido vituperado pelo meu péssimo
testemunho. Claro que o fato de muitos de meus pecados não terem se
tornado notórios não os justificam em nada nem os tornam menos graves,
mas, se há algum consolo, é que pelo menos Jesus e sua Igreja não foram
envergonhados pelo meu comportamento horrível. Temos a responsabilidade,
como cristãos, de dar exemplo em todo momento. Se vamos à igreja, damos
glória a Deus e aleluia, mas nos comportamos como os mais mundanos dos
mundanos, nos tornamos vergonha para o evangelho e não refletimos a luz
de Cristo. Se defendemos valores bíblicos mas fazemos isso em rede
nacional de TV aos berros, com agressividade e arrogância, em
absolutamente nada estamos lutando pela causa do Senhor, o exaltando ou
proclamando, mas sim traindo Jesus. Pregar o evangelho sempre deve ser
feito com mansidão. Sempre. Pois nosso tom de voz e o amor em nosso
olhar falam muito mais alto do que qualquer palavra que pronunciemos.
Afirmar no Jornal Nacional que “só o Senhor é Deus” enquanto se dá um
murro na cara de alguém glorifica Jesus?
.
“Ah, pelo menos o evangelho foi pregado”, muitos justificam. E eu pergunto: foi mesmo?
.
Nenhum de nós é perfeito. Eu e você pecamos e escorregamos muitas
vezes por dia. Todo dia. Mas temos o dever de nos empenharmos ao máximo
para viver aquilo em que cremos. Ainda mais diante do mundo. Costumo
dizer que Deus não espera de nós perfeição, pois ele sabe que nunca
seremos perfeitos. Mas ele espera, na verdade, o máximo possível de
esforço para alcançar a perfeição. Porque isso sim é possível.
Se
baterem no seu carro, meu irmão, minha irmã, trate quem bateu com amor.
Ele não fez de propósito – creio eu. Se alguém te ofender, não devolva
mal com mal (Rm 12). Se te passarem para trás, ande a segunda milha (Mt
5.39-41). Dar a outra face não é ser frouxo nem banana, é ser crente.
Pois, se não formos diferentes do mundo, em que somos diferentes do
mundo? Se agimos como mundanos somos apenas mundanos que frequentam uma
igreja. Ser cristãos exige de nós caminharmos na direção oposta do que
todos caminham, nadar correnteza acima, trafegar pela contramão do
mundo. Temos de ser ETs – pois realmente somos alienígenas, peregrinos
em terra estranha.
.
É fundamental que demos o exemplo para o mundo. Em palavras, ações e
reações. E isso exige de nós esforço, pois o velho homem tem uma
capacidade impressionante de pôr a nova criatura para escanteio. Ser sal
e luz exige que façamos as coisas ao contrário do que nossa natureza
humana determina. Porque, se não o fizermos, a única coisa que dirá que
somos cristãos – para o mundo e também para Deus - serão os adesivos
evangélicos na traseira de nossos carros.
.
Paz a todos vocês que estão em Cristo,
Maurício
Fonte: Apenas
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