O ocaso da igreja evangélica brasileira - o Festival Promessas
>> sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
Por Márcio Jones
Meu intuito ao analisar o referido festival é ser coerente e bíblico. Desejo que aqueles que se puserem a ler este texto o façam, o mais possível, isentos de parcialidade ou preconceitos. Que apartem de si todo o ideário que se criou a título de evangelicalismo moderno, sejam noções, conceitos, vertentes doutrinárias, tudo quanto se convencionou reputar como institutos que integram a estrutura desse evangelho “paralelo” que entre nós, brasileiros, se originou, e volvam seus olhos para o cristianismo bíblico, apostólico e reformado. Urge regressarmos à Escritura e aos dois mil anos de teologia ortodoxa para ‘examinarmos’, a referida questão — e tantas outras —, não solitariamente, mas ladeados por profetas, evangelistas, apóstolos, reformadores e puritanos.
O que
dizer do aludido festival? Comecemos pelo fim. Qual é o grande problema
da humanidade? Simples, é a equivocada noção do que vem a ser o homem.
“Se a ideia básica sobre o que é homem estiver errada, então,
necessariamente, também estará errada a ideia a respeito do que pode ser
feito em favor dele”[1]. Steven J. Lawson afirma que o mais grave
problema da humanidade é o diagnóstico errôneo de seu estado. Há os que
entendem que a raça humana vai bem, obrigado! E, dessarte, o seu
problema reside no meio em que está inserta. Doutra sorte, há os que
enxergam a raça humana como um indivíduo enfermo, o qual se encontra
debilitado, quiçá no leito de morte, contudo ainda consciente e
recuperável, cuja saúde, ainda que lentamente, vai sendo restabelecida.
Logo, ainda há capacidade em si mesma. Por último, o real e
incontrastável diagnóstico é o esposado pelo evangelho de Cristo,
segundo o qual o homem está fisicamente vivo, mas morto espiritualmente,
separado de Deus[2] — não há justo, nem um sequer, não há quem entenda,
não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram
inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer...pois todos
pecaram (Rm 3:10-11, 23a).
Diante
de um cenário de morte espiritual, o que demanda ser feito? Promover
momentos de comoção coletiva, reafirmar a identidade evangélica
brasileira por meio de um cristianismo atuante politicamente, em favor
de uma emissora promíscua que abarrota os bolsos à custa de cantores que
anelam popularidade e que cognominam eventos desse caráter de
avivamento?! No itinerário da Sagrada Escritura, não, peremptoriamente.
Precisamos, sim, expor, devassar a atual condição pecaminosa do homem,
seu estado de morte e já putrefação dado o pecado no qual está
inteiramente submerso e do qual se fez vassalo. Certa feita, um repórter
inquiriu ao pr. Paul Washer acerca do porquê de ele falar tanto sobre
pecado. Washer respondeu: “Porque eu quero que você ame a Deus”[3]. É
dizer, enquanto o homem não compreende que é mau todo o desígnio de seu
coração (Gn 6.5), que a inclinação de sua natureza caída é de inimizade
para com Deus (Rm 8.7), que é ele não só amante (Jo 3.19), mas escravo
do pecado (2 Pe 2.19), não há possibilidade de arrependimento e, com
efeito, salvação.
Jesus
afirmou em João 5.25: Em verdade, em verdade vos digo que vem a hora e
já chegou, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de Deus; e os que a
ouvirem viverão. O dito versículo aduz o chamado eficaz por intermédio
da voz de Cristo, enquanto Deus concede aos espiritualmente mortos
capacidade para reagir ao evangelho. Calvino pontificou a natureza da
pregação da Palavra, a saber a “voz de Deus”, afirma Franklin
Ferreira[4]. Prossegue o mencionado autor ao dizer que Calvino, “em seu
comentário de Isaías, afirma que na pregação "a palavra sai da boca de
Deus de tal maneira que ela sai, de igual modo, da boca de homens; pois
Deus não fala abertamente do céu, mas emprega homens como seus
instrumentos, a fim de que, pela agência deles, possa fazer conhecida a
sua vontade". Ora, nesse mesmo itinerário o apóstolo Paulo atesta que
“aprouve a Deus salvar os que creem pela loucura da pregação” (1 Co
1.21b) e que “a fé vem pela pregação, e a pregação pela palavra de
Cristo” (Rm 10.17). Arremata Paulo: Como, porém, invocarão aquele em
quem não creram? E como crerão naquele de quem nada ouviram? E como
ouvirão, se não há quem pregue? (Rm 10.14). Portanto, é insofismável que
o meio de propagação da mensagem de Cristo é a exposição da Escritura, a
apresentação de todo o conselho de Deus (At 20.27), não o
fortalecimento da imagem de um pseudo-deus — por meio de canções
humanistas, românticas e triunfalistas, completamente alijadas de teor
bíblico-teológico —, gestado segundo o senso comum e tudo que lhe
compraz.
Portanto,
ignorar a condição em que se encontram os ímpios e encará-la sob esse
diapasão é similar a um médico que constata o câncer que acomete a um
paciente e lhe degenera o ser, porém diz-lhe que seus sintomas
referem-se a um simples resfriado, que pode ser facilmente combatido por
um leve analgésico. No caso em tela, muitos afirmam que o festival em
comento tem difundido o evangelho. Pergunto: que evangelho? O evangelho
de um deus que é somente amor, mas não justiça; o evangelho de um deus
que livra da tribulação, e não na tribulação; o evangelho de um deus que
faz todos os seus filhos ascenderem profissional, social e
financeiramente; o evangelho de um deus que não permite a um filho seu
sofrer de enfermidade; o evangelho de um deus que se revela mediante
experiências, e não em sua Palavra; o evangelho de um deus cuja vontade é
atropelada pelo querer do homem, o qual determina, decreta e profetiza;
o evangelho que traz um “avivamento” em meio a uma sociedade cada vez
mais corrupta, violenta, hedonista. Esse não é o evangelho de Jesus
Cristo, a Boa Nova de salvação.
O
evangelho não se trata de uma proposição ideológica ou filosófica, a
cuja compreensão chega o ouvinte/leitor a depender a capacidade
lógico-argumentativa do pregador/escritor, muito menos de eventos
musicais midiáticos que denotam o grande número do povo dito evangélico
brasileiro e a sua força política. O evangelho é poder de Deus para a
salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16), apreendido intelectualmente
por um homem quando o Senhor lhe abre o coração (At 16.14; Jo 6.65)
compungindo-o profundamente. A Palavra de Deus não necessita de muletas,
adendos, apêndices para se adequar à realidade do século XXI. O homem
precisa, sim, ser confrontado com a realidade e ser chamado ao
arrependimento (Mt 3.2; 4.17; At 2.38). Que preguemos a Cristo, e este
crucificado!
Notas:
[1] LLOYD-JONES, David Martyn. Sincero, mas errado. São Paulo: Editora FIEL, 1995. p.13.
[1] LLOYD-JONES, David Martyn. Sincero, mas errado. São Paulo: Editora FIEL, 1995. p.13.
[3]WASHER,Paul. O verdadeiro evangelho. São Paulo: Editora FIEL, 2012. p. 58
Fonte: Despertar de um avivamento
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