Neopentecostalismo à brasileira: aspectos e dimensões
>> segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
Por Johnny Bernardo
Inspirado
em movimentos de “cura divina” dos Estados Unidos, o neopentecostalismo
que aqui se desenvolve surge da observância de aspectos locais, como a
crendice popular e a baixa renda da maior parte da população brasileira.
Neste quesito, a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) destaca-se
como um dos principais exemplos de adaptação religiosa. Leonildo
Silveira Campos (1999) destaca que “o ponto de partida da IURD é o
pentecostalismo de alguns televangelistas norte-americanos, porém a sua
flexibilidade é própria de uma entidade que se posiciona bem num
ambiente pluralista e concorrencial. A sua identidade é construída por
meio de referências aos concorrentes, com os quais ela se envolve em
renhidas lutas simbólicas”.
A guerra
entre as forças do bem e do mal – adaptada pelo neopentecostalismo a
partir do pentecostalismo – ganha nova dimensão com a Igreja Universal.
Na verdade, como explica Campos, “a IURD oferece produtos simbólicos,
dissimulando a ideia de ruptura, trocando-a por uma aparente
continuidade com as culturas locais”. Em outras palavras, a igreja
fundada por Edir Macedo aproveita aspectos dos concorrentes (católicos,
afro-brasileiros e kardecistas) para desenvolver uma característica
própria, voltada ao consumo. Assim, a cruz, as sessões de descarrego, as
fitinhas azuis e demais apetrechos utilizados pela igreja em sua
“guerra” contra o mal são adaptações criadas com o intuito de atrair
adeptos das religiões concorrentes. Ao mesmo tempo, tenciona facilitar o
acesso à nova fé com elementos do cotidiano do adepto.
As
adaptações – ou “remasterizações” – feitas pela IURD também ocorrem nas
demais igrejas neopentecostais do Brasil, com pouquíssimas alterações.
Tais características e outras mais mostram que o neopentecostalismo
disseminado a partir da IURD assume aspectos locais, nacionais, da
situação financeira de cada adepto. O termo neopentecostal –
frequentemente usado em referência a Igreja Universal do Reino de Deus e
a Renascer em Cristo, por exemplo – passou a ser utilizado como forma
de distinção entre o pentecostalismo clássico do movimento que começa a
se desenvolver a partir de fins da década de 70, e que é identificado
por Paul Freston como a Terceira Onda Pentecostal Brasileira. Tão logo
se percebeu, no entanto, que há uma imensa distância entre o
neopentecostalismo aqui disseminado.
Apesar
da existência de elementos comuns ao Neopentecostalismo, como a cura
divina, o exorcismo, a Teologia da Prosperidade e o uso maciço de
recursos audiovisuais, há inúmeras diferenças que separam as várias
igrejas neopentecostais, notadamente entre àquelas situadas no eixo São
Paulo – Rio. As diferenças locais, de formação religiosa ou acadêmica,
explicam em parte as diferenças. A primeira das várias rupturas que
ocorreriam no cenário neopentecostal brasileiro se deu em 1980 quando o
missionário R.R.Soares – até então braço direito de Edir Macedo – funda a
Igreja Internacional da Graça de Deus (IIGD). A prepotência e o
espírito mercantilista de Edir Macedo foram alguns dos motivos que
levaram R.R.Soares a se desligar.
Igrejas clones da Universal
Começando
pela IIGD, deve-se ressaltar também o aparecimento do que Marion Aubree
(pesquisadora francesa) chamou de “igrejas clones da Universal”. Isto
é, ao longo dos 35 anos de sua história, a IURD vem enfrentando o ataque
externo oriundo de novos movimentos neopentecostais que a imitam. Vale
ressaltar, novamente, que às semelhanças se resumem aos aspectos básicos
do Neopentecostalismo, descritos anteriormente. Os novos movimentos
surgidos a partir da IURD se definem por experiências próprias, por
diferenças que vão desde a liturgia até o público alvo.
As
diferenças são perceptíveis quando comparamos, por exemplo, a IIGD com a
IURD. Segundo R.R.Soares, a Igreja da Graça não tem bispos nem realiza
campanhas em Israel. A Universal, por sua vez, não tem um missionário
como presidente, nem pede às pessoas que se inscrevam como
patrocinadoras para manter a veiculação de cultos de evangelização pela
TV. A IIGD apresenta-se mais flexível com relação ao trato com as demais
igrejas evangélicas do Brasil. Nas publicações da Igreja da Graça, como
na revista Show da Fé, são comuns referências a trabalhos da AD.
R.R.Soares também já teve passagem pela sede da AD Ministério Belém,
onde ministrou a um colegiado de obreiros. Por outro lado, há de se
ressaltar que a Igreja da Graça é a responsável pela publicação da
maioria dos livros de Kenneth Hagin, autor com ampla rejeição por parte
de líderes e pesquisadores brasileiros, como Paulo Romeiro.
As
diferenças entre a Igreja Universal com as demais denominações
“neopentecostais” aumenta à medida que a comparamos com igrejas como a
Renascer em Cristo. A origem pentecostal do casal Hernandes – eram
membros da Igreja Pentecostal da Bíblia – de certa forma explica a
maneira eloquente como conduzem suas reuniões. As adaptações, comuns na
IURD, também ocorrem na RC, mas com diferenças que nos remetem às
igrejas batistas. Há, na RC, uma tentativa de tornar suas reuniões mais
atraentes ao público jovem. Fundador da Comunidade Evangélica Sara Nossa
Terra, o bispo Robson Rodovalho teve sua primeira experiência na Igreja
Presbiteriana do Brasil, aos 15 anos. Além da maneira despojada como
conduz sua denominação, Rodovalho é autor de um livro sobre Física
Quântica e pretende criar um instituto para explorar temas ligados à
ciência e a espiritualidade. Apesar de criacionista, rejeita a noção de
que o universo foi criado há seis mil anos, em seis dias de 24 horas,
segundo revelou ao jornalista Márcio Campos, da Gazeta do Povo.
A
Renascer em Cristo e a Sara Nossa Terra são exemplos de igrejas cujas
características distanciam-se de denominações mais próximas do chamado
Movimento Palavra da Fé. No entanto, mesmo entre as igrejas
neopentecostais historicamente ligadas ao MPF há diferenças
significativas. A cura divina, característica comum às igrejas
neopentecostais, é vista de forma diferente por frequentadores da Igreja
da Graça e Mundial do Poder de Deus. Mariano (1995) declara que é
“muito comum nos cultos da Igreja Internacional da Graça R.R. Soares
pedir que os fieis coloquem as mãos em suas cabeças e determinem a cura
divina. Com frequência, os testemunhos giram em torno do desaparecimento
da dor de cabeça e do sumiço de caroços no peito, no estomago e em
outras partes do corpo. Alguns ex-membros da IIGD e que hoje frequentam a
IMPD são unânimes em dizer que lá, na Internacional, só viam sumiços de
caroços, mas que na Mundial eles veem verdadeiros milagres, curas
sobrenaturais”.
O
surpreendente crescimento da Igreja Mundial do Poder de Deus – e que já
foi palco de pelo menos quatro cisões que resultaram no surgimento de
quatro diferentes igrejas, cada qual defendendo uma visão específica do
Evangelho, sendo a Igreja Mundial Renovada a mais recente – tem sido
motivo de preocupação e “guerra santa” por parte da Igreja Universal do
Reino de Deus. Embora mantendo aspectos da igreja – mãe, o apóstolo
Valdomiro Santiago criou uma marca ou estilo próprio de arregimentar
adeptos. Com seu jeito matuto e linguagem carregada de expressões
populares, Santiago conseguiu criar um canal de comunicação com as
classes menos favorecidas da sociedade. A cura divina é um dos atrativos
e porta de entrada para centenas de pessoas vítimas da falta de
recursos assistenciais. Segundo Campos (1999) os “muito pobres são mais
facilmente atingidos pela pregação dos milagres e dos prodígios. Nesse
sentido, a Igreja Mundial, a Igreja do Evangelho Quadrangular ou mesmo a
Deus é Amor levam vantagem nessas camadas sociais mais pobres onde a
IURD perde a competitividade”.
Fonte: Gospel+
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